Os Pilares Esquecidos do ESG no Brasil: Um
Chamado à Ação por Governança e Responsabilidade Social
Paulo
Josef Gouvea da Gama – Atuário MIBA 978 – Especialista em ESG
Na edição de janeiro/fevereiro de 2025
da revista Investidor Institucional, uma matéria intitulada "ESG
EM TEMPOS DE NEGACIONISMO" trouxe à tona preocupações sobre os
impactos das políticas negacionistas climáticas dos EUA no cenário global. No
entanto, enquanto o componente ambiental ("E") domina as discussões e
os investimentos, os pilares de governança ("G") e responsabilidade
social ("S") permanecem subexplorados no Brasil. Este artigo busca
ampliar a análise, oferecendo uma visão complementar sobre esses aspectos
negligenciados e propondo caminhos para equilibrar essa agenda crucial para o
futuro sustentável do país.
Enquanto
a agenda ESG (ambiental, social e governança) ganha força no Brasil,
ferramentas como a COP30 e a Taxonomia Sustentável Brasileira incentivam a
atenção ao componente "E" (ambiental). No entanto, os pilares
"S" (social) e "G" (governança) continuam subexplorados. É
preciso ampliar a análise e propor um debate sobre como equilibrar essa agenda
crucial para um futuro sustentável.
Governança:
Um Pilar Frágil no Brasil
A governança corporativa, representada
pela letra "G" no acrônimo ESG, é fundamental para garantir
transparência, ética e accountability nas decisões empresariais. No entanto,
conforme apontado por Werner Roger, sócio fundador da Trígono Capital, muitas
empresas brasileiras ainda enfrentam desafios estruturais nesse campo, como:
O
excesso ou ausência de comitês: Algumas empresas possuem comitês demais,
enquanto outras não têm nenhum.
A
falta de diversidade nos conselhos: A sub-representação feminina é um exemplo
marcante. Como observa Roger, "há casos em que não se encontra mulheres
nas diretorias".
Rotatividade
excessiva de conselheiros: Muitos atuam em múltiplos conselhos simultaneamente,
comprometendo sua eficácia.
Esses
problemas refletem diretamente na qualidade das decisões estratégicas e na
capacidade das empresas de mitigar riscos. Além disso, há uma resistência
cultural em relação à representação de minoritários nos conselhos, muitas vezes
vistos como "espiões" pelos controladores. Essa mentalidade limita a
diversidade de perspectivas e prejudica a inovação.
Os
investidores institucionais, incluindo EFPCs (Entidades Fechadas de Previdência
Complementar) e RPPSs (Regimes Próprios de Previdência Social), têm um papel
crucial nesse cenário. No entanto, conforme destacado na matéria, essas
instituições ainda não estão cobrando suficientemente das empresas melhorias em
governança. Roger relata que "algumas empresas foram provocadas por nós e
hoje têm seus relatórios de sustentabilidade", mas reconhece que essa
pressão ainda é insuficiente.
Exemplo
Prático: A Natura implementou um programa de diversidade que resultou em maior
representação feminina em seus conselhos. Essa iniciativa não apenas melhorou a
tomada de decisões estratégicas, mas também fortaleceu a reputação da empresa
no mercado global.
Responsabilidade
Social: Uma Agenda Invisível
Se
a governança já enfrenta desafios, a responsabilidade social é ainda mais
negligenciada. A letra "S" no ESG representa o impacto das empresas
nas comunidades locais, condições de trabalho, diversidade e inclusão, entre
outros aspectos. No entanto, essas questões raramente aparecem nos relatórios
oficiais ou nas discussões sobre investimentos sustentáveis.
Roger relata que, durante a elaboração
do relatório de sustentabilidade da Trígono Capital, a consultoria ATA precisou
intervir junto às empresas para obter informações sobre iniciativas sociais que
sequer constavam nos relatórios. "Às vezes isso acontece por questões
burocráticas, que poderiam ser facilmente resolvidas", observa. Essa falta
de transparência e comprometimento reflete uma visão limitada do papel das
empresas na sociedade.
No
Brasil, onde desigualdades sociais profundas persistem, a responsabilidade
social deveria ser uma prioridade. No entanto, conforme destacado na matéria,
"as empresas não se importam e ninguém fala nessas duas letras a não ser
para inglês ver". Essa crítica é particularmente relevante em setores como
o agronegócio, onde as comunidades locais são diretamente impactadas pelas
operações das empresas.
Exemplo
Prático: A Marfrig adotou práticas de rastreabilidade e controle de
desmatamento ilegal, beneficiando tanto as comunidades locais quanto o meio
ambiente. Esse tipo de iniciativa deve ser replicado em outros setores.
Por
Que Esses Pilares São Importantes?
Ignorar as dimensões "S" e
"G" pode ter consequências graves para os investimentos e para a
sociedade. Problemas de governança, como corrupção ou decisões inadequadas de
remuneração, podem prejudicar a reputação e a sustentabilidade financeira das
empresas. Da mesma forma, questões sociais mal geridas, como conflitos com
comunidades locais ou violações de direitos trabalhistas, podem resultar em
sanções legais e perda de valor de mercado.
Além
disso, a ausência de diversidade nos conselhos e a falta de atenção às
necessidades das comunidades locais reduzem a capacidade das empresas de inovar
e se adaptar a um mundo em rápida transformação. Como aponta Roger, "a
maior representação feminina poderia até mesmo ajudar a dar uma visão
diferenciada das questões sociais".
O
Papel dos Investidores Institucionais
Os
fundos de pensão e outras entidades de investimento institucional têm uma
responsabilidade fiduciária de garantir retornos sustentáveis a longo prazo.
Isso inclui não apenas aspectos financeiros, mas também socioambientais. No
entanto, conforme destacado na matéria, muitos desses fundos ainda não estão
engajados de forma ativa em questões de governança e responsabilidade social.
Luciana Puccetti, gerente executiva de
Renda Variável e Análise de Investimentos da Vivest, reconhece que há um
esforço crescente para engajar empresas investidas em temas ESG. No entanto,
ela observa que "é preciso esperar mais um pouco para entender na prática
o significado" das mudanças globais no cenário ESG. Isso indica que há
espaço para maior proatividade.
Henrique
Jáger, presidente da Petros, destaca que a entidade reiterou sua adesão ao
Código Stewardship da Amec (Associação de Investidores no Mercado de Capitais)
e intensificou a incorporação de aspectos qualitativos e quantitativos em sua
avaliação de empresas. No entanto, ele reconhece que ainda há muito a avançar.
Soluções
Práticas: Para
impulsionar melhorias, os investidores institucionais podem adotar práticas
como:
- Criar
indicadores claros para avaliar o desempenho das empresas em governança e
responsabilidade social.
- Participar
ativamente de assembleias e votar contra práticas inadequadas.
- Engajar-se
em projetos coletivos, como o Spring do PRI, que busca influenciar
empresas a cessarem ou reverterem a perda de biodiversidade.
Rumo
a um ESG Equilibrado
Para
que o ESG cumpra seu propósito de promover um futuro mais sustentável, é
fundamental que os pilares de governança e responsabilidade social recebam a
mesma atenção dedicada ao ambiental. Isso exige maior engajamento por parte dos
investidores institucionais, que devem pressionar as empresas por transparência
e melhores práticas em todas as dimensões do ESG.

Os
próximos anos serão decisivos para o Brasil, especialmente com eventos como a
COP30 e a implementação da Taxonomia Sustentável Brasileira. Esses marcos
oferecem uma oportunidade única para colocar as letras "S" e
"G" no centro das discussões e garantir que a agenda ESG seja
verdadeiramente equilibrada e eficaz.
Como
conclui Werner Roger, "se o mercado não cobrar itens de governança, as
informações ESG ficarão muito concentradas no 'E' de ambiental". Para
evitar esse desequilíbrio, é hora de os investidores e empresas brasileiras
darem aos pilares "S" e "G" a importância que merecem.
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