segunda-feira, 21 de abril de 2025

Os Pilares Esquecidos do ESG no Brasil: Um Chamado à Ação por Governança e Responsabilidade Social

 

Os Pilares Esquecidos do ESG no Brasil: Um Chamado à Ação por Governança e Responsabilidade Social

Paulo Josef Gouvea da Gama – Atuário MIBA 978 – Especialista em ESG

Na edição de janeiro/fevereiro de 2025 da revista Investidor Institucional, uma matéria intitulada "ESG EM TEMPOS DE NEGACIONISMO" trouxe à tona preocupações sobre os impactos das políticas negacionistas climáticas dos EUA no cenário global. No entanto, enquanto o componente ambiental ("E") domina as discussões e os investimentos, os pilares de governança ("G") e responsabilidade social ("S") permanecem subexplorados no Brasil. Este artigo busca ampliar a análise, oferecendo uma visão complementar sobre esses aspectos negligenciados e propondo caminhos para equilibrar essa agenda crucial para o futuro sustentável do país.

Enquanto a agenda ESG (ambiental, social e governança) ganha força no Brasil, ferramentas como a COP30 e a Taxonomia Sustentável Brasileira incentivam a atenção ao componente "E" (ambiental). No entanto, os pilares "S" (social) e "G" (governança) continuam subexplorados. É preciso ampliar a análise e propor um debate sobre como equilibrar essa agenda crucial para um futuro sustentável.

Governança: Um Pilar Frágil no Brasil

A governança corporativa, representada pela letra "G" no acrônimo ESG, é fundamental para garantir transparência, ética e accountability nas decisões empresariais. No entanto, conforme apontado por Werner Roger, sócio fundador da Trígono Capital, muitas empresas brasileiras ainda enfrentam desafios estruturais nesse campo, como:

O excesso ou ausência de comitês: Algumas empresas possuem comitês demais, enquanto outras não têm nenhum.

A falta de diversidade nos conselhos: A sub-representação feminina é um exemplo marcante. Como observa Roger, "há casos em que não se encontra mulheres nas diretorias".

Rotatividade excessiva de conselheiros: Muitos atuam em múltiplos conselhos simultaneamente, comprometendo sua eficácia.

Esses problemas refletem diretamente na qualidade das decisões estratégicas e na capacidade das empresas de mitigar riscos. Além disso, há uma resistência cultural em relação à representação de minoritários nos conselhos, muitas vezes vistos como "espiões" pelos controladores. Essa mentalidade limita a diversidade de perspectivas e prejudica a inovação.

Os investidores institucionais, incluindo EFPCs (Entidades Fechadas de Previdência Complementar) e RPPSs (Regimes Próprios de Previdência Social), têm um papel crucial nesse cenário. No entanto, conforme destacado na matéria, essas instituições ainda não estão cobrando suficientemente das empresas melhorias em governança. Roger relata que "algumas empresas foram provocadas por nós e hoje têm seus relatórios de sustentabilidade", mas reconhece que essa pressão ainda é insuficiente.

Exemplo Prático: A Natura implementou um programa de diversidade que resultou em maior representação feminina em seus conselhos. Essa iniciativa não apenas melhorou a tomada de decisões estratégicas, mas também fortaleceu a reputação da empresa no mercado global.

Responsabilidade Social: Uma Agenda Invisível

Se a governança já enfrenta desafios, a responsabilidade social é ainda mais negligenciada. A letra "S" no ESG representa o impacto das empresas nas comunidades locais, condições de trabalho, diversidade e inclusão, entre outros aspectos. No entanto, essas questões raramente aparecem nos relatórios oficiais ou nas discussões sobre investimentos sustentáveis.

Roger relata que, durante a elaboração do relatório de sustentabilidade da Trígono Capital, a consultoria ATA precisou intervir junto às empresas para obter informações sobre iniciativas sociais que sequer constavam nos relatórios. "Às vezes isso acontece por questões burocráticas, que poderiam ser facilmente resolvidas", observa. Essa falta de transparência e comprometimento reflete uma visão limitada do papel das empresas na sociedade.

No Brasil, onde desigualdades sociais profundas persistem, a responsabilidade social deveria ser uma prioridade. No entanto, conforme destacado na matéria, "as empresas não se importam e ninguém fala nessas duas letras a não ser para inglês ver". Essa crítica é particularmente relevante em setores como o agronegócio, onde as comunidades locais são diretamente impactadas pelas operações das empresas.

Exemplo Prático: A Marfrig adotou práticas de rastreabilidade e controle de desmatamento ilegal, beneficiando tanto as comunidades locais quanto o meio ambiente. Esse tipo de iniciativa deve ser replicado em outros setores.

Por Que Esses Pilares São Importantes?

Ignorar as dimensões "S" e "G" pode ter consequências graves para os investimentos e para a sociedade. Problemas de governança, como corrupção ou decisões inadequadas de remuneração, podem prejudicar a reputação e a sustentabilidade financeira das empresas. Da mesma forma, questões sociais mal geridas, como conflitos com comunidades locais ou violações de direitos trabalhistas, podem resultar em sanções legais e perda de valor de mercado.

Além disso, a ausência de diversidade nos conselhos e a falta de atenção às necessidades das comunidades locais reduzem a capacidade das empresas de inovar e se adaptar a um mundo em rápida transformação. Como aponta Roger, "a maior representação feminina poderia até mesmo ajudar a dar uma visão diferenciada das questões sociais".

O Papel dos Investidores Institucionais

Os fundos de pensão e outras entidades de investimento institucional têm uma responsabilidade fiduciária de garantir retornos sustentáveis a longo prazo. Isso inclui não apenas aspectos financeiros, mas também socioambientais. No entanto, conforme destacado na matéria, muitos desses fundos ainda não estão engajados de forma ativa em questões de governança e responsabilidade social.

Luciana Puccetti, gerente executiva de Renda Variável e Análise de Investimentos da Vivest, reconhece que há um esforço crescente para engajar empresas investidas em temas ESG. No entanto, ela observa que "é preciso esperar mais um pouco para entender na prática o significado" das mudanças globais no cenário ESG. Isso indica que há espaço para maior proatividade.

Henrique Jáger, presidente da Petros, destaca que a entidade reiterou sua adesão ao Código Stewardship da Amec (Associação de Investidores no Mercado de Capitais) e intensificou a incorporação de aspectos qualitativos e quantitativos em sua avaliação de empresas. No entanto, ele reconhece que ainda há muito a avançar.

Soluções Práticas: Para impulsionar melhorias, os investidores institucionais podem adotar práticas como:

  • Criar indicadores claros para avaliar o desempenho das empresas em governança e responsabilidade social.
  • Participar ativamente de assembleias e votar contra práticas inadequadas.
  • Engajar-se em projetos coletivos, como o Spring do PRI, que busca influenciar empresas a cessarem ou reverterem a perda de biodiversidade.

Rumo a um ESG Equilibrado

Para que o ESG cumpra seu propósito de promover um futuro mais sustentável, é fundamental que os pilares de governança e responsabilidade social recebam a mesma atenção dedicada ao ambiental. Isso exige maior engajamento por parte dos investidores institucionais, que devem pressionar as empresas por transparência e melhores práticas em todas as dimensões do ESG.

Os próximos anos serão decisivos para o Brasil, especialmente com eventos como a COP30 e a implementação da Taxonomia Sustentável Brasileira. Esses marcos oferecem uma oportunidade única para colocar as letras "S" e "G" no centro das discussões e garantir que a agenda ESG seja verdadeiramente equilibrada e eficaz.

 

Como conclui Werner Roger, "se o mercado não cobrar itens de governança, as informações ESG ficarão muito concentradas no 'E' de ambiental". Para evitar esse desequilíbrio, é hora de os investidores e empresas brasileiras darem aos pilares "S" e "G" a importância que merecem.

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